sexta-feira, 30 de novembro de 2012

FALSO GRAAL

Inventei a ironia numa toada de vento
Roubei as asas a uma gaivota azul
Colei-lhes um poema cheio de penas
E enviei-o para uma tonta do sul

Inventei um mar numa bola de sabão
Roubei uma corda forte e boa
Atei um rol de mágoa à mesma
E afoguei-as nas águas de uma lagoa

Inventei uma criatura de nome amor
Roubei-lhe a maldade por tempo indeterminado
Pintei suas vestes com as cores do arco-íris
Achei-a feia e fiquei pasmado

Já chega de invenções…
Todas elas saídas de contradições
Apenas uma era verdadeira
Porque foi gerada de mil emoções

Está maluquinho o poeta zinho…!?
Deixou de funcionar este ser em desalinho
Recolheu do prato um ramo de amarguras
Meteu pernas à lonjura do caminho

Andou às voltas até ter dores nas costas
Sacudiu a alma e bebeu um pedaço do céu
Fechou os olhos e sem querer pisou um falso fantasma
Que fez um terrível escarcéu

Eu não dizia que isto são mesmo maluqueiras
E quando assim é só pode dar para o torto
Este poeta pateta já não aguenta com gente
Já parece estar meio-morto

E para fechar a loucura com chave de ouro
Fiquei convencido de ter encontrado um tesouro e coisa e tal
Era apenas uma estranha criatura, qual Eva
De rosto lindo espelhado num…Falso Graal…

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

MARGENS OPOSTAS

Tacteei minha sombra caída
Os ramos de uma magnólia cedem ao vento
Ergui num deserto um castelo de raivas
Segui numa distância infinita ladrilhada de mágoas

Já não posso dar-te a mão, cheguei tarde
Entre ruinas procuro o sentido, a razão
Já não canto aos deuses, não rezo
Já esqueci o sabor do desprezo, não desprezo

Tracei um círculo de solidão
Ausente do meu nome está o chamamento
Jazem mudas as folhas de silêncio
Errantes brumas ao sabor do vento

Percorri um longo e tortuoso caminho
Moro numa casa da memória no topo da saudade
Prodígios de mil cores espalhei pelo caminho
Pintei almas, mentiras, girassóis e singelas verdades

Talvez seja apenas nevoeiro desmoronado pela luz
Um grito ecoando num mar inebriado
Um plantador da sublime palavra
Um arcanjo em luta eterna com o diabo

Lutei tanto por ti…
Luto com espadas de fogo e esperança
Não há idades para amar com amor
Não há barco que nos leve no fugir à dor

Oiço uma soluçante chuva
Uma menina de destroçado coração
Oiço um pássaro chato cantar todas as manhãs
Li gravado num banco de jardim a palavra perdão

Rumores incendiados, céu menstruado de paixão
Mãos urgentes afagam estátuas incompletas
Neste rio de furiosas águas sonhado pelo pintor
Quedo-me só eu e a estupidez em…Margens Opostas…

sábado, 17 de novembro de 2012

AS FILHAS DE UM FALSO DEUS

Imensa funda e impenetrável noite
Onde as trevas soltam gigantes feitos de sombra escura
Caminheiro, caminhante, sem rumo ou vontade
Teu coração e alma serão ungidos com água pura

A virgindade perdida ao travo do cigarro de uma puta
Um marinheiro tonto de arrogante atitude
Duas maçãs podres atiradas à sargeta
Um sorriso estupido a cantar uma peta

Olá deusa Grega caçadora de orgasmos mentais
Olá gente estupidamente contente
Há tanta estupida pessoa que me acha louco
Algumas dizem coisas que me deixam menente

Mas, que é isto?
O poeta descalçou-se em frente à palavra
Mete-me raiva mulheres agrupadas
Não quero ser semente de perversa lavra

Observado pelo mundo ficou ausente o meu nome
Dispersos pedregulhos de silêncio empurraram-me o ficar
Insondáveis são as teias da maldade
Levanto-me todas as manhãs ausente do amar

Na passagem, vi a memória ausente dos teus olhos
Respiro uma estação já morta
No êxodo das manhãs escrevo a raiva
Há um castelo azul com o azar preso à porta

Uma criptoméria tomba contra a fundura do tempo
Escrevo para que não oiçam o clamor desta nua alma
Escrevo para que ninguém se ache nestas palavras
Escrevo para que nunca esmoreça esta minha chama

No caminho do inverno ouvi o grito do bravio mar
Sentei-me de olhos fechados e lembrei alguns pecados meus
Lembrei pessoas que não mereceram o abraço
Lembrei algumas…Filhas de Um Falso Deus…

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

PEDRA e ÁGUA

Hoje um espelho envelheceu a minha alma
Devorei de raiva o pão da pobreza
Calei-me para melhor ouvir os dias
Escrevi na areia duas palavras, melancolia e tristeza

Desnudei-me à frente das tuas últimas palavras
Ouvi a respiração das eternas estátuas
Entre mim e o teu coração há o clangor das espadas
Conheço o teu nome, a verdade das tuas mágoas

Cinco letras…
Cinco pontas de cadente perdida na aurora
Na loucura de alguns instantes escrevo
Descalço vou adiante num ir longe, embora

Solto das mãos murmúrios sussurrantes
Do basalto explode um bando de pombos bravos, alguns negros
Há um livro branco apenas com a palavra ausência
Há uma carta de marear para um rumo de mil segredos

Flores de solidão crescem em pedaços de fria lava
Um espantalho saltou-me do bolso a remexer
Uma sombra desceu a janela e tocou-me
Cerrei olhos para sentir o que não queria ver

Cobri-me no lume das noites frias
Arderam quietas minhas emoções pungentes
De pássaro me transmutei em alquimia
Num ritual enterrei no barro meus anseios ardentes

Sou um pescador de calmarias
Um apagado trovador perdido da sua sombra
Raras são as pulseiras de pedaços de estrelas
Raras são as palavras de verdade que minha alma lembra

Eles não sabem que “Este Eu” é uma ilha de nostalgia
Uma casa de memória prisioneira da mágoa
Correndo entre o rumor do Mar e a fria bruma
Feito de cru barro, prisioneiro da…Pedra e Água…

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

AMARGO NOVEMBRO

São mudas as neblinas nesta ilha
É de pobreza o pão que alimenta o meu sentir
Oiço o mar com os meus próprios dedos
Parti do desencontro dos meus derradeiros medos

Parti e deixei no cais mil dúvidas
Lembrei tempos que corri feliz pelas amoras
Nesses dias bebi sofregamente a vida
Nesses dias a minha alegria era incontida

Estou ausente do amor e desta terra
As memórias secaram numa lagoa inventada
Este barco que me carrega em solidão
Sem trégua será o resto desta história inacabada

Entre mim e o amor existe dúvida e dor
Frias são as pedras de uma casa sem o branco da cal
Este Inverno espalhou presentes dourados sem valor
Este fogo sem chama, este ardor, este frio de falso calor

Sou uma Garça perdida na areia
Anoiteceu no meu olhar
Perdi as penas, perdi-me na terra das ilusões
Perdi-me no mar num sonho que não quero acordar

Já não há música para fazer crescer alegria dos meus gestos
Já não há cores para fazer obra que preste
Já não há alma guerreira para ouvir o que dizem os dias
Já não há lembrança de Primavera neste vento agreste

Eriçado matagal de espinhos
Olá pobreza das estéreis vinhas
Olá gente descrente deste desbotado retrato
Olá palco onde deixei tantas emoções minhas

Apenas resta a brancura dos meus sentires
E pequenas coisas que ainda lembro
Quero apenas ter nos olhos o silêncio
E adormecer neste…Amargo Novembro…